quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Tribo Maasai

Sempre que viajo para outros países, gosto de visitar vinícolas, tribos e montanhas. Primeiro porque adoro tomar vinho, segundo porque adoro aprender sobre diferentes culturas e em terceiro, porque adoro atingir o topo e vencer desafios!
No Quênia há aproximadamente 42 tribos, sendo que a mais famosa se chama Maasai. Não pela quantidade de pessoas, mas pela forma diferenciada de viverem e se vestirem.
Uma Maasai em frente à sua manyatta (cabana)
Através da NVS, organização pela qual estou trabalhando como voluntária, tive a oportunidade de visitar uma Maasai Land (Terra dos Maasai), em Saikeri Village, há aproximadamente duas horas do centro de Nairobi.
A estrada para chegar ao local é de terra e super esburacada. O acesso só é possível através de um automóvel 4x4. Absolutamente tudo dentro da van ficou com uma camada espessa de  poeira – mochila, roupas, sacos de dormir, até mesmo meu cabelo e minha pele. Saikeri é um lugar quente e extremamente seco.
Começamos visitando uma escola onde moram aproximadamente 25 garotas resgatadas de suas casas por correrem risco de mutilação e/ou por já terem sido violentadas.
Atualmente, mutilação é ilegal na África, mas ainda assim algumas famílias mais conservadoras e me atrevo  a dizer até mesmo mais primitivas, tentam mutilar suas filhas quando elas atingem a faixa dos 12 anos de idade. Algumas delas fogem para esta escola, pois sabem que lá estarão protegidas e as professoras chamarão a polícia. Os pais não as buscam porque sabem que serão presos.
Para quem não sabe, a mutilação feminina consiste em cortar o clitóris com uma gilete e costurar os lábios vaginais, deixando apenas um pequeno orifício para que elas possam urinar. Na crença deles, as mulheres não devem sentir prazer e isso também evita que façam sexo antes do casamento. Ao se casarem, os maridos simplesmente as “rasgam” com uma faca.
Quando não são mutiladas, são violentadas sexualmente. Há muitas meninas nesta vila, na faixa dos 12 a 15 anos, que já têm filhos. Porém, até 20 anos atrás, fazer sexo forçadamente não era considerado estupro. Para os homens das tribos era algo normal praticar sexo com qualquer mulher que vissem pela frente. Elas sabiam disso e não relutavam.
Além da mutilação feminina, ainda hoje as tribos também realizam a circunsisão nos meninos que atingem seus 15 anos de idade. Eles simplesmente “passam a faca”! O que também se tornou ilegal. Há anos atrás, quando um grupo de meninos era circuncidado, eles nunca mais se desuniam e podiam inclusive praticar sexo com as esposas um dos outros. Ou seja, era algo totalmente cultural e tribal.
Além desses rituais, até hoje, em algumas regiões da África e até mesmo entre os Maasais, um dote é oferecido para a família da mulher com a qual desejam se casar. Aqui chamam de dowry  e normalmente oferecem vacas, cabras e parte em dinheiro.
Já na Índia é o contrário. Lá a família da mulher é quem oferece o dote para a família do homem. Eles consideram essa oferenda, como uma forma de presentear a família em troca de sua futura esposa e continuarão fazendo esta oferenda para o resto de suas vidas. Eles comemoram de anos em anos, como se fossem as “bodas” no Brasil, mas aqui, não há data certa.
No entanto, as tribos costumavam “oferecer” suas filhas quando elas completavam 12 anos de idade, pois já eram consideradas mulheres. Dessa forma, nenhum homem poderia tocá-la até que ela fosse morar com seu futuro marido, caso contrário, ele seria chicoteado e expulso da tribo. Atualmente, casar uma criança com 12 anos de idade também se tornou ilegal na África.
Conversando com jovens Maasais, me disseram que atualmente eles pensam em terminar os estudos, arranjar um emprego e daí sim se casar com alguém que realmente estejam interessados. E sobretudo, apenas com uma mulher, pois a geração de seus pais e avós geralmente tinham mais de uma esposa. Cheguei a visitar uma família que o marido tinha oito esposas morando em um mesmo terreno, que eles chamam de Bomas.
Bomas (terreno) cercado por galhos
Os Maasais cercam suas bomas com galhos e dentro, constroem cabanas chamadas Manyattas. As Manyattas são sempre construídas pelas mulheres, com galhos e esterco. Tive a oportunidade de visitar essas cabanas, que na verdade são verdadeiras saunas, além de escuras e cheias de moscas. Uma vez dentro, eu não enxergava nada! A não ser quando os flashes das câmeras digitais eram disparados.
Manyattas (cabanas construídas com galhos e esterco)
Cozinha de uma manyatta
Dentro da manyatta com uma Maasai
Além de construir as manyattas, as mulheres também lavam, cozinham, cuidam das dezenas de crianças (que também ajudam com os afazeres da casa), fazem suas tradicionais bijuterias, como também saem em busca de água em algum rio preenchido pelas chuvas, mas ainda assim, escassos. Andam por horas, sob sol ardente, carregando barris de água pesadíssimos nas costas.
Maasai sentada em meio à sua família, confeccionando suas tradicionais bijuterias
Crianças carregando lenha
Uma Maasai carregando telhado para construir sua manyatta
Enquanto isso, os homens levam seus animais para pastar e passam o dia inteiro fora, caminhando milhares de kilômetros, em busca de água e pasto. 
Ao entardecer, fomos visitar a única escola noturna da vila, onde há aproximadamente 01 ano, os Maasais têm aprendido a ler e escrever. Esta escola foi criada por um voluntário australiano, muito famoso na região por suas benfeitorias. Ele continua enviando dinheiro mensalmente para mantê-la ativa. Esta escola é frequentada apenas pelos homens, uma vez que passam o dia inteiro pastoreando os animais.
Ewangan School - Escola noturna apenas para homens
Não há eletricidade na vila, mas felizmente, há energia solar nas escolas. Após caminharem o dia inteiro, os Maasais ainda caminham mais aproximadamente 40 km (ida e volta), no meio da escuridão, para poderem estudar.
Uma das salas da escola noturna
Para entender e sentir na pele o quanto os Maasais andam diariamente, nos levaram para uma caminhada por suas terras. O final da estrada, dava para um abismo, de onde pudemos ver o Great Rift Valley, maior vale do mundo, bem como um belo pôr do sol.
Pôr do sol visto do Great Rift Valley, o maior vale do mundo
Passamos a noite na primera escola que visitamos, porém, os professores estavam de greve, portanto as meninas tiveram que voltar para suas casas. Não dormi a noite inteira! As beliches era de ferro e portanto, barulhentas. Sem contar os colchões, que na verdade era colchonetes!


Antes de dormir, os Maasais fizeram uma fogueira para nosso grupo de oito mulheres e pela primeira vez eles comeram marshmallows e continuaram nos contando mais sobre sua cultura.

Não há água na escola, muito menos na vila. Ou seja, não há como tomar banho. Mesmo porque, também não há banheiros, apenas as famosas latrinas. Portanto, não esqueça de levar lenços umedecidos!
Quando já não aguentávamos mais segurar, eu, minha irmã e mais algumas voluntárias saímos à procura de uma latrina. Foi uma das piores experiências da minha vida – fazer “minhas necessidades” em um buraco, agachada, em meio a diversos insetos e ainda por cima, na maior escuridão!
Sem contar que nesta vila há 8 mil habitantes, bem como hienas, cheetas e leopardos. Só fiquei tranquila em caminhar no meio do mato na maior escuridão, porque os Maasais nos garantiram que nunca ninguém foi atacado por esses animais.
As cheetas e leopardos costumam atacar as vacas e cabras, sendo que as hienas só comem os restos. Dessa forma, os Maasais são obrigados a matar esses lindos animais, caso contrário, perderão seus rebanhos e sua fonte de alimento.
Para reconhecer seus rebanhos, os Maasais marcam seus animais fazendo cortes com facas, deixando cicatrizes enormes. E por falar em cortar, eles também bebem o sangue desses animais, misturado com leite, pois acreditam que isso os tornam mais fortes.

Antigamente também havia outra utilidade para este sangue. Quando uma criança nascia com alguma deficiência, as famílias não apenas as rejeitavam, como as amarravam em uma árvore e jogavam sangue em seu corpo, de forma a atrair animais para comê-las. Realizavam este mesmo ritual com os idosos, uma vez que já não podiam cuidar de si próprios.
Maasai idosa, com aproximadamente 100 anos de idade (ou mais...)
No dia seguinte, visitamos a pré-escola da vila e um Maasai Market (feira aberta), onde vendem seus famosos tecidos coloridos e suas bijuterias. Os Maasais acreditam que cores fortes, em especial o vermelho, os protegem  contra ataques de animais selvagens.
Saikeri Primary School
Maasai Market
Por fim, visitamos a única clínica da região. Porém, não há médicos, apenas uma enfermeira Maasai que teve a sorte de poder estudar e ainda assim retornou para sua vila, para ajudar seu povo.
Maggie é mais uma das mulheres de fibra que conheci aqui no Quênia. É a única Maasai que teve coragem de quebrar as tradições tribais e se divorciar de marido devido à violência doméstica e ainda por cima, criar 03 filhos sozinha. Ela está há milhares de anos luz mais evoluída que sua tribo e é ela quem tem lutado contra mutilação e violência sexual.
Foi uma experiência incrível visitar essa tribo, conhecer seus bomas, suas manyattas, consersar pessoalmente com eles e saber o que pensam e como vivem. Mas foi mais incrível ainda saber que a NVS, ONG para a qual estamos trabalhando aqui no Quênia, também ajuda esta vila e parte do dinheiro dos voluntários é investido em alimento e educação para os Maasais.
Eu e minha irmã com uma família de Maasais


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